O presidente Almeida Santos
Ontem, na “Quadratura do Círculo”, Almeida Santos saiu-se com duas tiradas antológicas, daquelas a que sempre nos habituou (aliás, Almeida Santos é daqueles exemplos que contrariam a visão quase unanimemente aceite que antigamente é que existiam bons políticos e o Parlamento nacional era uma espécie de Atenas da antiguidade). Primeiro, Almeida Santos brindou-nos com esta máxima de La Palisse, atirando as suas eventuais responsabilidades na pífia descolonização para baixo do tapete: a culpa da descolonização, diz ele, é ter havido colonialismo in the first place. A culpa da descolonização, portanto, é de D. João II. O homem, há que reconhecê-lo, é um portento de silogismos. Pela mesma ordem de ideias, os responsáveis pelo “acidente” de Camarate são os irmãos Wright, que inventaram os aviões, malditos sejam. Depois, Almeida Santos, falando dos mortos e estropiados da guerra colonial, avançou com esta visão história original e brilhante: a ele, Almeida Santos, senador da Nação, não o incomoda muito os milhares e milhares de jovens que morreram a defender terras que nunca tinham conhecido e que não lhes diziam nada, uma vez que, desde o 25 de Abril, já morreram mais portugueses nas estradas e sobre isso ninguém fala. Antes de tudo, saúdo a conversão do Almeida Santos numa espécie de Manuel João Ramos, o presidente dessa obscura Associação de Cidadãos Auto-Mobilizados. Depois, saúdo também que Almeida Santos viva fora do século e se recuse a ver televisão. Eu, que por necessidade profissional vejo televisão, ando a chupar há anos com campanhas de prevenção rodoviária imbecis e ineficientes. Mas, para Almeida Santos, as campanhas, as operações de Natal, Carnaval, Páscoa, Verão e feriados, com todo histerismo dos noticiários à volta delas, não são suficientes. Como não parecem ser os milhares de manchetes que o “Correio da Manhã” já dedicou ao tema das mortes nas estradas. Não senhor. Para Almeida Santos, os portugueses deviam tratar esse tema ignorado ainda mais profundamente, em vez de passarem a vida a discutir, na televisão e nas tascas, a guerra colonial. Tudo isto em pouco menos de cinco minutos, numa única intervenção. É obra. E não podia deixar de referir a maneira tocante como Jorge Coelho se referiu a Almeida Santos como “o meu presidente” e este lhe deu duas ou três palmadinhas no joelho, qual Don Corleone a acariciar as bochechas dos seus protegidos. Para terminar, fiquei espantado com a confusão que o Lobo Xavier fez entre Jorge Sampaio e Almeida Santos, referindo-se à arbitrariedade da dissolução da Assembleia da República, no tempo do Governo PSD/CDS liderado por Santana Lopes, pelo “presidente da República Almeida Santos”. Duas referências a Almeida Santos como “presidente” em menos de vinte minutos. Será uma vaga de fundo PS/CDS para derrubar Cavaco Silva? Pelo sim, pelo não, já fiz as malas e deixei o passaporte à mão.
março 01, 2007
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