junho 12, 2008

Jogo de espelhos


















Contra as minhas expectativas, Barack Obama ganhou as primárias democratas. Na altura em que as primárias começaram escrevi aqui que “ao contrário do que se possa pensar, não será por causa dos brancos que Barack Obama não será eleito. Isso acontecerá – num país em que os negros representas pouco mais de 12% da população e os hispânicos quase 30% - por causa das restantes minorias. O politicamente correcto é um privilégio e um luxo das classes altas”. Até ver, não me enganei muito. Barack Obama ganhou as directas, sim. Mas o comentário que fiz na altura é válido também para as eleições presidenciais de 2009. Os WASP apoiam Barack Obama em esmagadora maioria, não porque admirem a pessoa em si, mas porque gostam de se ver ao espelho, mesmo que a imagem seja falsa. Os WASP norte-americanos gostam de pensar em si próprios como pessoas sofisticadas e cosmopolitas que apoiam um negro sem reservas, deixando as questões da raça – que eles gostam de pensar que já ultrapassaram – para os rednecks e os hispânicos. Mas, atenção, também esmagadoramente exigem que Hillary Clinton seja vice-presidente. Um negro na Casa Branca, tudo bem, desde que esteja uma WASP para o controlar (e escuso-me a comentar a campanha eleitoral da Hillary Clinton, com a inacreditável sucessão de gaffes e a imagem patética de um Bill Clinton que parece estar cada vez mais, como diria o Marcelo Rebelo de Sousa, lélé da cuca) . Depois de oito anos a serem tratados pelo mundo como uma seita de fanáticos, os norte-americanos querem provar ao mundo que são uma nação de progressistas. Tudo o que está em jogo é apenas isso mesmo: uma questão de imagem. Barack Obama sabe-o. Quanto menos falar de assuntos concretos, mais possibilidades tem de derrotar John McCain em 2009. A única frase com conteúdo que Barack Obama disse durante toda a campanha foi quando se referiu, logo no início, à questão racial, lembrando à jornalista da NBC que muitas pessoas pensam que os negros norte-americanos são tão pouco sofisticados que entregam de bandeja o seu voto ao primeiro negro que virem na televisão. “O voto dos negros tem de ser conquistado, como o de qualquer outra pessoa”. E Barack Obama tem razão, até porque o voto dos negros caiu invariavelmente para o lado de Hillary Clinton, que quando olham para a televisão não conseguem ver um negro em Barack Obama, mas um “deles”, “too white” (e numa sociedade matriarcal e que vive dos subsídios estatais, como a negra dos EUA, a imagem de uma mulher rica e branca que promete cuidar dos coitadinhos é irresistível). Mas Barack Obama também sabe que não precisa de conquistar os votos dos negros. Os votos dos brancos cosmopolitas estão assegurados, tal como o dinheiro dos actores de Hollywood para a campanha eleitoral (aliar-se a Barack Obama dá prestígio, tal como aliar-se a Woody Allen, mesmo que o filme seja uma flagrante merda). Com George W. Bush os norte-americanos tiveram de se olhar ao espelho e ver o que realmente são. Depois disso, preferem um espelho distorcido, que os torne mais atraentes, como nas feiras, mesmo que a imagem não mostre a realidade. É tão simples quanto isso.

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